O Brasileirão 2010 entrou na fase decisiva. O simples fato de ver como são dois argentinos que agarraram a sua face mais criativa, na posição de meias ofensivos, diz quase tudo do estilo que domina o atual futebol brasileiro. Eles são Montillo, no Cruzeiro, e Conca, no Fluminense, maestros dos dois grandes candidatos ao título.
O peso da influência destes jogadores é mais notório no Cruzeiro, pois Montillo chegou em meio a temporada (vindo de uma fantástica Copa Libertadores no U.Chile) e transformou a qualidade de jogo da sua nova equipe. No Fluminense, o grande reforço foi, na mesma fase, Deco, mas como no grupo já existia Conca, Deco teve de jogar em posições mais recuadas, perto da dupla de volantes que se coloca à frente da defesa, mas no caso do Flu, sem capacidade em sair para o jogo.
São eles Diogo, Valência ou Fernando Bob. Não está em causa o valor dos jogadores. Está em causa as suas características. O colombiano Valéncia é o que sai mais, mas erra muitos passes. Correm muito, mas na maior parte do tempo, em vez de correr com a bola (transportando-a para o ataque) correm atrás dos adversários.
A entrada de Deco foi decisiva para o treinador Muricy Ramalho mudar o sistema preferencial de 3×5x2 para 4×4x2. Continua a alternar entre eles (com laterais ofensivos, Mariano-Carlinhos) mas é no 4×4x2 que a equipe fica mais equilibrada taticamente, com Rodriguinho muito móvel e rápido, girando, na frente, em torno do veterano ponta-de-lança Washington, cada vez mais referência na área (o tipo de nº9 pesadão só possível ainda de existir no nosso futebol).
Deco se beneficia claramente do ritmo mais lento do futebol brasileiro, está muito menos intenso sem bola, só joga no pé, altura em que faz a diferença no passe. Nos outros momentos do jogo, desaparece, e deixa a recuperação para os médios pica-pedra do novo futebol brasileiro.
O Cruzeiro de Cuca joga num 4×4x2 mais europeu que por vezes parece um 4×3x3 quase único nos gramados brasileiros. Penso mesmo que é quando a equipe joga melhor. O jogador-chave para essa transformação é Ewerton, um ala canhoto que cai na esquerda, passando Tiago Ribeiro para a direita, ele que quando em 4×4x2 joga mais próximo do ponta-de-lança (Wellinton Paulista ou Farias).
O equilíbrio é dado pela dupla de volantes. Fabricio (muito bem no passe longo) e Henrique, que também saem bem para o jogo, soltando, à frente, Montillo, que, com organização criativa abre espaços nas defesas adversárias. No 4×4x2, sai Ewerton e entra Roger, para jogar mais atrás no meio, mas, muitas vezes, nesse sistema, choca com Montillo, o tipo de jogador-craque que precisa de liberdade para respirar bom futebol.
Depois de um início forte, o Corinthians quebrou nos últimos jogos. Adilson Baptista, o técnico, claro, acabou despedido. Não é fácil, porém, mudar muito a forma de jogar da equipe, na qual o jogador que mais lhe dá maior vida atacante em termos de criação é um meia ofensivo. Bruno César. Muito dinâmico, move-se em torno dos dois meias, vendo sobretudo onde caia Jorge Henrique indo, em geral, para o lado vazio, o oposto de onde ele está.
Outras vezes, recua para zonas entre-linhas e ordena o jogo. O atacante mais adiantado (com Ronaldo lesionado) tornou-se Iarley, de origem mais vagabundo, longe do perfil típico de um nº9. É um 4×4x2 que (com Roberto Carlos ainda vivo na esquerda) contempla três volantes mais de contenção: Ralf, Jucilei e Elias. Dos três, Ralf é o mais fixo. Jucilei é o mais forte e ganhando confiança para subir pode ser, no futuro, um grande jogador (tem 22 anos). Elias é hoje aquele que se pressente ter mais qualidade na defesa e no ataque, mas joga taticamente muito preso atrás para a visão de jogo que tem.
A equipe vive, assim, presa entre dois sistemas de jogo e não consegue estabilizar nenhum. Não tem um meia ofensivo criativo como Fluminense e Cruzeiro (Conca e Montillo) e isso está fazendo a diferença nesta fase decisiva do campeonato.